Autor (a): Craig Thompson
Editora: Companhia das Letras / Gênero: Graphic Novel / HQ
Páginas: 592 / Ano: 2009
Skoob / Amazon / Submarino
Olá pessoas, tudo bem
com vocês? Hoje a resenha que trago é de um livro que eu estava louca para ler
já fazia um tempinho: Retalhos, de Craig Thompson publicado pela Companhia das
Letras - uma graphi novel extremamente premiada. Sempre que eu ia a uma
livraria ficava folhando um pouquinho desse livro, vendo as imagens,
degustando. Ainda não tinha criado coragem para comprar porque estou com muitos
livros embalados ainda e o precinho dele costuma ser alto (ainda não tinha
encontrado uma promoção boa que me fizesse comprar, mas o desejo estava lá,
latente hahah). Eis que vou viajar e na pousada que fiquei, na biblioteca que
eles disponibilizam para os hospedes ele estava lá, lindo e reluzente, me
aguardando. E como choveu dois dias seguidos, foi a desculpa maravilhosa para
ficar debaixo das cobertas e ler o livro.
Ele é grosso, tem 592
páginas, mas como se trata de quadrinhos, a leitura é bastante dinâmica e
rápida. Confesso, porém, que eu me delongava um pouco mais em alguns quadros,
pois os desenhos são belíssimos e de uma profundidade sem tamanho. Quando eu
terminei a leitura, voltei várias vezes para espiar alguns dos desenhos que eu
mais tinha gostado, porque são lindos e carregados de sentimentos.
O livro é uma autobiografia
e traz o autor como personagem principal. Não sei se tudo o que ele narra na
história realmente aconteceu em sua infância e adolescência, ou se quis
retratar de modo geral como era a vida dos jovens criados no meio oeste dos
Estados Unidos: identidades moldadas fortemente na religião. Mas o tom denotado
pelo autor nos quadrinhos sugere uma religião muito opressiva, cega, que
mantinha fiéis através do temor a Deus. Craig cresceu achando que tudo o que
fazia era pecado, seus pais pouco conversavam sobre sentimentos, e quando
alguma coisa estava saindo do controle a premissa que usavam é: “você não pode
fazer isso, Deus não gosta, Deus castiga”.
Na mente de uma
criança isso se torna um emaranhado de imagens controversas e o autor vai
ilustrar muito bem essa ilusão distorcida da qual a religião fez parte. Craig
em sua inocência achava que não precisava de muito para agradar Deus. Inclusive
queria louvá-lo através de seus desenhos, dom que lhe era característico. Mas
quando falava deles ou os expunha para os adultos, achavam que desenhos não
eram algo que agradasse Deus e esperavam dele feitos maiores: sugeriram até que
seguisse a carreira religiosa.
Nos acampamentos
religiosos que aconteciam regularmente, Craig ficava ainda mais confuso, porque
via jovens pouco interessados na palavra de Deus e nas orações. Estavam mais
interessados em falar sobre quem iria pegar quem, sobre zombar e fazer bulling,
sobre drogas e assuntos mundanos. Craig se sentia deslocado a todo o momento
(um retrato bastante comum da fase da adolescência e me vi muito nele).
Eis então que surge
Raina, uma garota linda aos olhos de Craig e que vai mudar seu mundo de cabeça
para baixo. Porque Craig foi criado para temer Deus, para ver paixão e sexo
como pecado e Raina vai ser aquela pessoa que o vai deixar extremamente em
conflito interno.
A partir do momento
que Raina surge podemos perceber que Craig sai de sua pequena caixa e se
desdobra para o mundo. Ele vai começar a questionar seus sentimentos, o que foi
lhe imposto até o momento, e se realmente tudo é tão errado e desfigurado como
foi lhe proposto até então.
Por que amar é
pecado? Por que sentir devoção a outra pessoa também não pode ser um modo de
louvar a Deus?
Esse momento, do
primeiro amor, do se deixar levar pela primeira paixão, é lindamente retratado
pelo autor, tanto que os desenhos foram os que mais me prenderam, que mais me
apaixonaram.
Esse livro é um
tesouro, ele nos faz refletir sobre vários temas. Achei tocante o relato da
infância de Craig e seu irmão mais novo, o carinho que ambos tinham um pelo
outro, mesmo Craig achando que falharam em vários momentos, deixando de lado
seu papel como protetor. Isso soou tão doce pra mim, porque ele também era
somente uma criança e a responsabilidade pelos cuidados das crianças são dos
adultos. Mas eu também como irmã mais velha tinha essa ânsia de não deixar nada
de errado acontecer ao meu irmão.
Outros temas subentendidos também aparecem no decorrer do livro como abuso sexual infantil, divórcio, deficiência intelectual e síndrome de Down. Uma obra riquíssima em detalhes, que aborda os temais mais tabus, mas não de uma forma agressiva. É aquele tipo de livro que faz você repensar valores e que muitas das mudanças cruciais da nossa vida são tomadas a partir do momento que resolvemos seguir adiante. O amadurecimento está em muitas vezes deixar partir, insistir no que realmente nos faz feliz.
Não se enganem com a profundidade desse livro. Ele é denso, te faz descer até o último degrau da sua consciência. Te faz viver o amor (na sua forma mais pura e singela, entre irmãos, entre pessoas) e o terror (da opressão da religião, das teias perversas dos adultos para com as crianças, dos temores que nos são enraizados desde que nascemos e demoram a tomar outros rumos depois que moldados em nosso consciente). Uma leitura extraordinária, que vale a pena. Fui totalmente enganada por essa capa singela, hahaha. Achei que o livro seria bem leve, um romance mais suave. Pois é, foi mais para um tremendo tapa na cara e um soco no estomago - mais foi lindo, foi lindo ser nocauteada por ele!
Sinopse:
Uma das graphic novels mais premiadas dos últimos tempos, Retalhos é um relato autobiográfico da vida no meio-oeste americano. Thompson retrata sua própria história, da infância até o início da vida adulta, numa cidadezinha de , no centro dos Estados Unidos, que parece estar sempre coberta pela neve. Seu crescimento é marcado pelo temor a Deus - transmitido por sua família, seu colégio, seu pastor e as trágicas passagens bíblicas que lê -, que se interpõe contra seus desejos, como o de se expressar pelo desenho.
Ao mesmo tempo Thompson descreve a relação com o irmão mais novo, com quem ele dividiu a cama durante toda a infância. Conforme amadurecem, os irmãos se distanciam, episódio narrado com rara sensibilidade pelo autor.
Com a adolescência, seus desejos se expandem e acabam tomando forma em Raina - uma garota vivaz, de alma poética e impulsiva, quase o oposto total de Thompson - com quem começa a relação que mudará a visão que ele tem da família, do futuro, de Deus, e, enfim, do próprio amor. Retalhos traz as dores e as paixões dos melhores romances de formação - mas dentro de uma linguagem gráfica própria e extremamente original.